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Nova Lei de Improbidade Administrativa separa o joio do trigo

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Recentemente seguiu para sanção presidencial o projeto de lei, aprovado pelo Congresso Nacional, que modifica substancialmente a Lei 8.429/90, conhecida como a Lei de Improbidade Administrativa. As alterações têm causado importantes discussões no mundo jurídico e, também, na mídia. Uma das mais sensíveis foi a exclusão do ato culposo do agente público, que cause prejuízo ao erário, como ato de improbidade administrativa.

Nos termos do art. 37, § 4º, da Constituição Federal e da Lei 8.429/1992, qualquer agente público, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios pode ser punido com a pena de perda do cargo que ocupa, pela prática de atos de improbidade administrativa. Mas o que vem a ser um ato de improbidade?

O ministro Napoleão Nunes Maia, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de um Agravo em Recurso Especial, afirmou que: “A Lei de Improbidade Administrativa, como todos sabemos, nasceu com a finalidade de combater e sancionar as condutas dos agentes de atos que afetem a moralidade e maltratem a coisa pública; os seus comandos, todavia, são bastante abertos, havendo, portanto, a necessidade de utilizá-la com certa prudência, a fim de que o próprio instrumento jurídico não seja enfraquecido e se torne impotente, vulgarizando-se pelo excesso de sua utilização ou, até mesmo, que seja utilizado como mero mecanismo de repercussão nos elementos de disputa e competição eleitoral, por exemplo”.

Conforme preleciona o Ministro Garcia Vieira (REsp 213.994), a Lei de Improbidade “alcança o administrador desonesto, não o inábil”.

O artigo 10 da Lei de Improbidade, com a redação atual, aponta a possibilidade do reconhecimento de ato de improbidade quando o agente público causa dano ao erário culposamente, ou seja, quando não age com a intenção de causar o dano, mas por negligência, imprudência ou imperícia grave causa um prejuízo ao ente público. Seguindo a atual legislação, temos a figura do “desonesto por culpa”.

O ministro Napoleão Nunes Maia, antes mesma do início da tramitação do projeto de lei, já sinaliza sua preocupação em relação a imputação de ato de improbidade por culpa do agente público, senão vejamos: “O elemento subjetivo (dolo ou culpa) exigido para a configuração dos atos de improbidade traz à discussão a proposição dilemática de saber se o cometimento culposo dessa infração administrativa é (ou não) idêntico, similar ou igual ao cometimento doloso e, portanto, passíveis ambos da mesma sanção”.

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Com efeito, em boa hora o novo texto exclui a imputação de ato de improbidade por culpa do agente público. Não se pode olvidar que improbidade administrativa é ato de desonestidade do gestor público no trato da coisa pública. Ato de improbidade, por exemplo, é comprar camisinha feminina, para fornecer no Sistema Único de Saúde, pagar antecipadamente e saber que a empresa contratada não irá entregar e anuir com isso.

“A alteração não gerará
impunidade para o gestor
público desonesto, mas sim
deixará de ‘medir com a mesma
régua’ o agente imprudente ou
imperito que causar prejuízo
aos cofres públicos com a
sua falta de cuidado”

No entanto, muitos irão pensar que isso resultará em impunidade para o mal gestor ou para gestor incompetente. Não é verdade. O gestor que agir de forma imprudente ou negligente na condução da coisa pública e causar prejuízo deverá ser responsabilizado civilmente, devendo reparar o dano causado, mas não sofrerá as graves sanções da Lei de Improbidade Administrativa, que devem ficar reservadas, exclusivamente, para o agente que deliberadamente causar prejuízo aos cofres públicos.

Dessa forma, a alteração legislativa não gerará impunidade para o gestor público desonesto, mas sim deixar de “medir com a mesma régua” o agente negligente, imprudente ou imperito que causa prejuízo aos cofres públicos com a sua falta de cuidado. Repito, isso não importará na ausência de punição, pois o gestor poderá ser acionado em uma ação civil de reparação de dano, mas não as sanções de perda do cargo ou função pública, impossibilidade de contratar com a administração por um período etc.

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Cumpre destacar, por oportuno, que a ofensa ao artigo 10 da Lei de Improbidade impõe hoje ao gestor público que age com dolo ou com culpa a mesma penalidade, ou seja, impõe indistintamente as sanções do artigo 12, II, da LIA, que importam em severas restrições ao causador do dano, consoante se depreende do texto legal em vigor: “II – na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos”.

Diversamente do que apontam os cavaleiros do apocalipse, nesse ponto específico da alteração da Lei de Improbidade, não se vislumbra retrocesso ou causa de impunidade, mas sim uma correção de curso. Ou vocês acham razoável e proporcional tratar de forma igual o gestor desonesto e o descuidado?

Não há como finalizar sem relembrar saudoso Hely Lopes Meirelles: “Embora haja quem defenda a responsabilidade civil objetiva dos agentes públicos em matéria de ação de improbidade administrativa, parece-nos que o mais acertado é reconhecer a responsabilidade apenas na modalidade subjetiva. Nem sempre um ato ilegal será um ato ímprobo. Um agente público incompetente, atabalhoado ou negligente não é necessariamente um corrupto ou desonesto. O ato ilegal, para ser caracterizado como ato de improbidade, há de ser doloso ou, pelo menos, de culpa gravíssima”.

Marcelo Aith é Advogado, Latin Legum Magister (LL.M) em Direito Penal Econômico pelo Instituto Brasileiro de Ensino e Pesquisa – IDP, especialista em Blanqueo de Capitales pela Universidade de Salamanca e professor convidado da Escola Paulista de Direito

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Saidinha é contradição em meio a clima de insegurança

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A Câmara dos Deputados aprovou ontem (20) o projeto de lei que acaba com as saídas temporárias no sistema prisional brasileiro, restringindo o benefício apenas aos detentos do regime semiaberto que estejam cursando o supletivo profissionalizante, ensino médio ou superior. A proposta já havia sido aprovada pelo Senado e segue agora para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Atualmente, a legislação brasileira prevê, aos detentos do regime semiaberto, o direito às chamadas saidinhas quatro vezes por ano para convivência familiar e participação das comemorações em datas especiais. Eles devem informar endereço em que irão permanecer no período do benefício e recolher-se à residência no período noturno, das 19 horas às 6 horas do dia seguinte, assim como não podem frequentar bares e similares.

Neste ano de 2024, a primeira “saidinha” ocorreu entre os dias 12 e 18 de março. Apenas no estado de São Paulo, a imprensa noticiou que mais de 40 detentos acabaram detidos logo no primeiro dia em razão de descumprimento das medidas.

No geral, as estatísticas apontam que cerca de 5% dos presos beneficiados pela saidinha não retornam ao sistema prisional e muitos deles cometem crimes no período de vigência da medida. Um dos casos mais graves foi registrado em janeiro deste ano, quando um detento matou o policial militar Roger Dias da Cunha, de 29 anos, durante a saidinha de natal em Belo Horizonte.

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O caso causou revolta e pressionou o Senado a votar o projeto de lei logo no início do ano. A Câmara também tratou o tema com prioridade. A aprovação pelas duas casas é uma resposta à sociedade brasileira, que está cada vez mais imersa em um clima de sensação de insegurança.

Para se ter uma ideia, pesquisa do Instituto Ipsos, multinacional de pesquisa e consultoria com sede na França, divulgada neste mês de março, apontou que o Brasil é o país com população mais insatisfeita com a segurança pessoal, com desempenho pior do que, por exemplo, o México e a Colômbia. O percentual de satisfação entre os brasileiros é de 53%, enquanto a média mundial chega a 73%.

Os dados fazem parte do “Global Happiness 2024”, realizado em 30 países com mais de 24 mil pessoas ouvidas no período de 22 de dezembro de 2023 a 5 de janeiro de 2024. Os números do Brasil são ainda mais gritantes em comparação aos resultados de países que aparecem no topo da pesquisa. Na Indonésia, 89% dos entrevistados estão satisfeitos com a segurança pessoal. Em Cingapura e na Holanda a taxa é de 88% e na Índia chega a 83%.

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Dessa forma, as saídas temporárias são uma contradição em um país em que quase metade da população declara sensação de insegurança.

Há movimentos contrários ao fim das saidinhas, criadas como instrumento de ressocialização. Mas o Senado acertou ao manter o benefício para aqueles presos que estiverem matriculados e frequentando instituições de ensino. Não há ferramenta mais efetiva para a transformação social do que a Educação.

*Wilson Pedroso é consultor eleitoral e analista político com MBA nas áreas de Gestão e Marketing

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