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Lobista de MT diz que ganhou R$ 19 milhões em processo da J&F

Reportagem do site UOL mostra diálogo extraído do segundo chip do celular de Roberto Zampieri

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As conversas do lobista Andreson de Oliveira Gonçalves sobre venda de decisões do STJ (Superior Tribunal de Justiça) indicam a cobrança de valores milionários em troca da oferta de sua suposta influência junto aos gabinetes da corte.

 

Mais um cliente feliz”, afirmou Andreson de Oliveira Gonçalves

Em um dos diálogos, do dia 29 de abril de 2020, Andreson cita um processo da ministra Nancy Andrighi envolvendo uma disputa de R$ 600 milhões e diz que, pelo caso, teria faturado R$ 19 milhões do cliente. “Mais um cliente feliz”, afirmou. Naquele dia, a ministra havia proferido decisão favorável a uma das partes.

 

O caso tratava de uma disputa empresarial do grupo J&F sobre a Eldorado Celulose. Um grupo de Mato Grosso do Sul tentava anular, no Tribunal de Justiça do estado, aquisições da Eldorado que diluíram sua participação acionária na empresa.

 

Na conversa, Andreson não explica qual seria a parte que lhe contratou nem diz qual foi sua atuação no processo específico citado por ele. Sua esposa, a advogada Mirian Ribeiro Gonçalves, foi constituída como advogada da J&F e de empresas do grupo em diversos processos no STJ e em outros tribunais desde pelo menos 2020.

Esse caso citado na mensagem do lobista é anterior à disputa que a J&F trava com a chinesa Paper Excellence pelo controle da Eldorado. Nesse processo, uma empresa de Mato Grosso do Sul, a MCL Participações, ajuizou uma ação na Justiça local questionando a redução de sua participação acionária na Eldorado. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul chegou a proferir uma decisão suspendendo a convocação, pela J&F, de uma assembleia geral ordinária.

 

A J&F, entretanto, defendeu que o assunto deveria tramitar na 2ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem da Justiça de São Paulo, sob o argumento de que cláusulas do acordo de acionistas estabeleciam o estado de SP como foro para discussão de questões jurídicas.

 

A ministra Nancy proferiu uma decisão anulando a atuação do TJ de Mato Grosso do Sul e determinando que toda a competência ficasse com a Vara Empresarial de SP, conforme pedido da J&F.

 

Questionada, a J&F disse que ganhou o processo por unanimidade na Segunda Seção do STJ e que “nunca autorizou qualquer terceiro não constante dos autos a representá-la”. A troca de mensagens faz parte das provas em posse do CNJ e da Polícia Federal, mas até o momento não houve nenhuma investigação específica sobre esse caso citando o processo da J&F.

 

A ministra Nancy Andrighi afirmou, em nota, que sua decisão teve como base o contrato entre acionistas que estabeleceu o foro para as questões judiciais e disse que já colocou seu gabinete à disposição para contribuir com as investigações sobre suspeitas de venda de decisões por assessores (leia os posicionamentos ao final da matéria).

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Outra troca de mensagens do lobista aborda um processo da ministra Isabel Gallotti. Andreson envia ao seu interlocutor, no dia 22 de junho de 2020, uma minuta de decisão antes de ser efetivamente publicada no sistema. Na conversa, ele conta ter cobrado R$ 3 milhões da parte pela decisão, que favoreceu um produtor rural em um processo de recuperação judicial.

 

As suspeitas de venda de decisões por funcionários do STJ estão sob investigação da Polícia Federal. Até o momento, as investigações haviam sido abertas para apurar suspeitas de corrupção envolvendo funcionários de outros quatro ministros: Og Fernandes, Nancy Andrighi, Isabel Gallotti e Paulo Moura Ribeiro. O UOL revelou na quinta-feira (24) que o esquema também envolveu o gabinete de um quinto ministro, Antônio Carlos Ferreira.

 

A Polícia Federal tem indícios de que a transportadora de Andreson, a Florais Transportes, era usada como intermediária para fazer pagamentos a magistrados, segundo fontes ouvidas pelo UOL.

 

Nos últimos anos, como mostrou o UOL, Anderson e sua esposa acumularam um patrimônio milionário, com jatinhos e imóveis luxuosos. Além da transportadora, eles são donos de um grupo agropecuário, de um resort e de uma empresa de táxi aéreo. Eles atuam em cortes superiores em Brasília há cerca de uma década.

 

Investigação enviada ao STF

 

Esses novos diálogos foram extraídos pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) em um segundo chip do telefone celular do advogado Roberto Zampieri, assassinado a tiros em dezembro do ano passado, em Cuiabá. O material foi encaminhado para análise da Polícia Federal, que pode estender as apurações a esse novo gabinete

 

Nas mensagens, Zampieri e Andreson falam sobre pagamentos a funcionários do STJ, compartilham minutas de decisões ainda não proferidas e citam nomes de diversos ministros.

 

Ao analisar o material dos celulares de Zampieri, a Corregedoria do CNJ identificou em quais casos havia indícios concretos de irregularidades nas decisões dos gabinetes e encaminhou o material à PF. Isso ocorreu, por exemplo, quando os diálogos indicavam nomes de assessores, minutas de decisões e até mesmo suspeitas de pagamentos. As meras citações aos nomes dos ministros nos diálogos, sem indicar nenhuma circunstância concreta de conduta indevida, não geraram repercussão nas investigações.

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O inquérito da PF, então, teve início na primeira instância porque a investigação estava focada na conduta dos assessores. O caso, porém, foi enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal) depois que um relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) apontou transações suspeitas envolvendo uma autoridade com foro naquele tribunal —seria o caso, por exemplo, de um ministro do STJ. O relatório do Coaf, entretanto, não apresentou o nome do alvo das suspeitas. Por isso, a PF enviou a apuração do caso ao STF.

 

O relator é o ministro Cristiano Zanin, que enviou o material ao procurador-geral da República, Paulo Gonet, para definir quais providências serão tomadas na investigação.

 

Outro lado

 

Procurada, a J&F afirmou que ganhou o processo por unanimidade na Segunda Seção do STJ e que se tratava de um “caso simples”, com base no acordo de acionistas.

 

“O conflito de competência foi suscitado pelo próprio TJ-MS, e não pela J&F. A Segunda Seção do STJ referendou a decisão citada de forma unânime, por 9 votos a zero, definindo a competência para julgamento da ação em São Paulo. Tratava-se de um caso simples: o contrato em disputa, o acordo de acionistas e a sede da empresa indicavam que o foro competente para o julgamento era a Justiça paulista. Posteriormente, a J&F venceu o processo em todas as instâncias. A J&F foi representada pelos advogados devidamente constituídos e nunca autorizou qualquer terceiro não constante dos autos a representá-la”, afirmou a empresa, em nota.

 

A defesa de Andreson e Miriam disse que não iria se manifestar porque não teve acesso ao teor das mensagens e ao inquérito, mas frisou que o conteúdo do celular do advogado Roberto Zampieri só poderia ser usado para a apuração do crime de homicídio.

 

A ministra Nancy Andrighi negou irregularidades na decisão judicial e disse que se baseou no contrato de acionistas, que estabeleceu o foro específico para as disputas judiciais. Leia a íntegra da nota da ministra:

 

Esta é a informação: as partes, por contrato, convencionaram eleição de foro. Nessa situação, nós, juízes, somos obrigados a respeitar o que as empresas pactuaram. Esse foi o julgamento que fiz: obedecendo o que as partes convencionaram quando fizeram o negócio.

 

Acompanho com perplexidade as denúncias e já coloquei meu gabinete à disposição para contribuir na elucidação dos fatos. Confio que a apuração realizada pelo Superior Tribunal de Justiça e as investigações das demais autoridades policiais servirão para esclarecer em definitivo o assunto e punir de forma exemplar os envolvidos.

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Desembargadores do TJ embolsam R$ 32,9 milhões em ‘penduricalhos’ durante um ano; confira

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O Tribunal de Justiça (TJMT) pagou R$ 32,9 milhões em folha complementar aos desembargadores, em 2024, montante referente aos “penduricalhos” que não são limitados pelo “teto constitucional”, fixado em cerca de 44 mil.  O Olhar Jurídico mapeou pagamentos aos 39 magistrados da Corte no ano passado e constatou que, neste período, houve aumento exponencial entre os meses de maio a dezembro

Se o montante total de R$ 32.917.692,79 fosse dividido igualmente entre todos os membros da Corte, daria uma média de R$ 844 mil por magistrado durante um ano, o que representa mais de R$ 70 mil mensais.

Para se ter uma ideia, o pagamento dos “supersalários” é tão expressivo que se assemelha ao que o Governo do Estado está investindo para reformar a nova sede do entro Estadual de Referência de Média e Alta Complexidade (Cermac) e do MT Hemocentro, em construção em Cuiabá. O custo total da obra é estimado em R$ 33,3 milhões, pouco menos do que o total pago pelo Judiciário aos magistrados. 

Para se ter uma ideia do quão elevado é o pagamento de tais penduricalhos, Anova sede do Centro Estadual de Referência de Média e Alta Complexidade (Cermac) e do MT Hemocentro, em construção em Cuiabá, está com cerca de 45% das obras concluídas e deve ser entregue à população a partir de 2025. O custo total da obra é estimado em R$ 33,3 milhões.

O contracheque dos funcionários do judiciário de Mato Grosso é dividido em dois: uma parte chamada “folha corrente” e a outra chamada “folha complementar”, onde cabem penduricalhos como adicional por tempo de serviço, abono de permanência, abono férias, gratificação natalina, retroativos e indenizações como os auxílios alimentação, transporte, pré-escolar, natalidade, saúde, moradia e ajuda de custo.

O desembargador Luiz Ferreira da Silva figura no topo dentre seus colegas, tendo embolsado R$ 1.08 milhão durante todo o ano na “complementar”. Neste mesmo recorte, ele é seguido por Jorge Luiz Tadeu Rodrigues (R$ 1.05 milhão), Rodrigo Curvo (R$ 1.055 milhão), Luiz Saboia Ribeiro (R$ 1.009 milhão) e José Lindote (R$ 996 mil).

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Usando Luiz Ferreira como exemplo dos altos recebimentos dos demais, a reportagem verificou que ele recebeu mais que o dobro nos pagamentos a partir do mês de maio. De janeiro a abril, ele recebeu entre 25 e 27 mil. Em maio e junho, recebeu R$ 140 mil, respectivamente. Em julho (R$ 109,4 mil), agosto (R$ 109,4 mil), setembro (R$ 109,4 mil), outubro (R$ 109,6 mil), novembro (R$ 109,6 mil) e dezembro (R$ 177,6 mil).

Segundo na lista, Jorge Luiz Tadeu também viu os rendimentos complementares crescerem a partir de maio, quando ele embolsou R$ 64 mil, mais que o dobro dos R$ 31 mil que ganhou em abril. O mesmo se repetiu entre os demais, com exceção de Hélio Nishiyama, Marcos Regenold e Wesley Sanchez, que não eram magistrados e entraram na Corte no decorrer do ano pelo Quinto Constitucional.

Na semana passada, o Olhar Jurídico fez um levantamento referente ao mês de dezembro de 2024 e constatou que os dois maiores recebimentos foram de Maria Aparecida Ferreira Fago, no total de R$ 250 mil e Maria Erotides Kneip, R$ 245 mil, distribuídos em duas folhas diferentes, a “corrente” e a “complementar”.

Elas são seguidas pelos desembargadores José Lindonte, que recebeu R$ 207 mil (R$ 29 mil da Corrente e R$ 177,9 mil da Complementar); Vandymara Zanolo, R$ 206,7 mil; Helena Maria Bezerra Ramos, R$ 206,1 mil; Rubens de Oliveira, R$ 206,09 mil; Carlos Alberto Rocha, R$ 204,9 mil; Orlando Perri, R$ 204,4 mil; Juvenal Pereira, R$ 203,8 mil e Maria Helena Póvoas, R$ 203 mil.

A título de exemplo, o salário recebido no mesmo mês pelo ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, de R$ 24,6 mil, é quase dez vezes menor que os 245 mil pagos à Kneip. O total gasto pela corte para pagar os magistrados foi de R$ 7,2 milhões.

Afastados das respectivas funções por ordem do próprio STF, ante suspeita de integrarem esquema de venda de sentenças, os desembargadores Sebastião de Moraes e João Ferreira Filho embolsaram, respectivamente, R$ 71,6 mil e R$ 75 mil em dezembro. Isso é quase o triplo dos R$ 26 mil pagos ao ministro Alexandre de Moraes.

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Sebastião embolsou pela folha complementar, durante todo 2024, o total de R$ 625,3 mil, enquanto João Ferreira, no mesmo período, levou R$ 626 mil.

Além dos gastos milionários para quitar os altíssimos salários, a Corte estadual também enfrenta um “momento desafiador”, conforme dito pela própria presidente Clarice Claudino, que levou R$ 202 mil no último mês e mais de um milhão no ano passado nas duas folhas. Presidente do STF, Luis Roberto Barroso recebeu R$ 27 mil em dezembro de 2024.

Recentemente, a presidente se tornou centro de polêmica sobre pagamento de verba denominada extraoficialmente como “vale-peru”. Em dezembro, Claudino determinou a majoração do vale-alimentação dos servidores do TJMT, de R$ 2 mil para R$ 10 mil. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) chegou a determinar a suspensão do pagamento. Porém, conforme noticiado pelo Olhar Direto, quando da determinação, o empenho já havia sido realizado.

Para além da discussão do CNJ, Clarice foi acionada no Supremo Tribunal Federal (STF). Ação aponta que desde o ano de 2023, quando a magistrada assumiu a presidência, o Tribunal de Justiça já gastou mais de R$ 45 milhões com o “vale-peru. Assim, o processo pede que, caso o mérito seja julgado positivo, Clarice seja condenada a restituir o valor pago.

Sebastião e João Ferreira, afastados desde 1º de agosto, estão com tornozeleira eletrônica desde o dia 26 de novembro, quando o ministro Cristiano Zanin ordenou que eles fossem monitorados. A dupla é suspeita de negociar decisões judiciais para atender a supostos interesses lobistas do advogado Roberto Zampieri, assassinado em dezembro de 2023 e do empresário Andresson Oliveira Gonçalves.

As investigações no “Iphone Bomba” de Zampieri revelaram esquema de negociações de decisões perante o TJMT e até no Superior Tribunal de Justiça (STJ). No celular, foram flagradas conversas entre o advogado, Sebastião de Moraes e João Ferreira Filho, bem como com Andreson.

Confira aqui a tabela completa 

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